sábado, 26 de setembro de 2009

Ressentimento



Sofro ao relembrar,
Pois, ao reviver,
Retorno a ficar
Na presença do sofrer.

O passado doloroso,
Enraizado na memória,
Se faz então penoso,
Fabrica minha história.

Todo esse ressentir
Movido por essa vontade,
Incontrolada no devir,
Faz parte da interna maldade.

O impulso à destruição,
Imanente e lento,
Domina minha ação,
Constrói meu tormento.

Devo suprir esses fantasmas,
Causadores de aflição,
Promotores de angútias,
Geradores de inquietação.

Para enfim superar,
Há de se desprender
E, aos poucos, regurgitar
As amarras do viver.

Vinicius de Moraes

A ausência da poesia,
A necessidade que invade,
A tristeza.
Que alarde!

Preso, novamente,
Nas inconstâncias da mente,
Na insuficiência da vontade,
Que arde!

Os desejos de voltar
Às formas simples de amar
Nessa vida tão pequena.
Que pena!

Nesses desvios da procura,
A realidade mostra-se obscura
Nas buscas de faíscas de amor.
Que dor!

Quero voltar,
Viver,
Amar,
Mas para isso há que se dar.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Koan Zen



"Dois monges discutiam a respeito da bandeira do templo, que tremulava ao vento. Um deles disse:
- A bandeira que se move.
O outro disse:
- É o vento que se move.
Trocaram ideias e não conseguiam chegar a um acordo. Então Hui-neng, o sexto patriarca, disse:
- Não é a bandeira que se move. Não é o vento que se move. É a mente dos senhores que se move.
Os dois monges ficaram perplexos."

Saudade



Saudade do teu perfume,
Que às vezes acho que sinto.
Impulso instantâneo,
Na lembrança repito.

Saudade da tua voz,
A qual finjo ouvir.
Feminina, gostosa,
Forço a memória a sentir.

Saudade do nosso beijo,
No qual vejo o infinito.
Com olhos fechados,
O tempo não sinto.

Saudade de te fitar,
Bem de perto,
Pra fixar,
Com o olhar curto,
A imagem do amar,
Sem nenhum turvo.

E, felizmente,
Toda a saudade é preenchida,
Rapidamente,
Com mais perfumes marcantes,
Mais beijos paralisantes
E mais olhares inocentes.

sábado, 27 de junho de 2009

Segunda ordem



A energia, o espírito, as trocas,
São impossíveis de descrever.
A linguagem só produz associação com a matéria e sentimento.
E mesmo suas metáforas são insuficientes.

Pra passar pro papel
As percepções mais profundas da alma,
Precisa-se transpô-las a figuras de linguagem
Relacionadas a coisas físicas.

Sem a transmissão direta,
O entendimento só pode ser relembrado,
Sendo previamente necessário
E somente para o reconhecimento.

A aprendizagem espiritual independe do dizer.
Suas tentativas de registro
Apenas auxiliam e fixam confirmações
Ao reconhecermos, nelas, as raízes de suas motivações.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Ação e reação



Escrever? Sobre o que?
Os caminhos que a vida toma?
É um bom tema.

Questiono sobre a influência que nossas ações têm
Sobre nossos rumos.

Não sua inegável existência e determinância,
Mas o estado em que tais são cometidas.

Pois nosso estado as determinam,
Sendo a raiz.
As ações são os galhos,
A consequência os frutos,
Maduros ou podres,
E o que causou esse estado,
Causa indireta da ação,
O Solo.

Colhemos o que plantamos?
Ou somos a própria colheita?
Colhida também pelo universo.

E a ação correta?
Se existe, há também de haver um estado correto.
E, se nosso estado é determinado pelo o que acontece,
Fechamos um ciclo.

Mas existe o livre-arbítrio!
Só que desconheço sua total independência de escolha.
Vejo, então, que para ser livre é necessário
A prévia libertação dos estados,
Não sua contenção.
E somente não sendo influenciado pelos acontecimentos
Isso é possível.

A conexão com nosso destino é sempre constante,
Mas para vê-la não há de haver julgamento,
Pois este é ancorado ao que passou.

Se deve estar alheio, porém atento.
Inteiro, porém solto de nossas internalidades.
Despreocupado, porém consciente.
Desprendido do passado, porém aberto ao futuro.
E isso se faz no presente.


domingo, 17 de maio de 2009



Nossa árvore cresce
Enquanto a raiz desaparece.
Portanto não se esqueça
Para que ela não esmoreça.

domingo, 10 de maio de 2009



"God is a concept by which we measure our pain..."

domingo, 22 de março de 2009

Tremido pulsar



Há uma inquietude interna,
O pulso é constante.
O espírito está quente
Enquanto o corpo hiberna.

A alma, morna,
Incita o intelecto, sem cessar.
Tão fortemente,
Que o fluxo do pensamento
Corre sem pausar.

Toda essa corrente,
Por ser tão intensa,
Não tem coerência.
E o que se pensa
Embrulha a consciência.

Para associar corretamente,
O fluxo deve ser pulsante.
Esferas de conexões,
Ampliando infitamente.

O equilíbrio da mente
Reflete no ente,
E quando as idéias não oscilam
O corpo enfim sente.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

"A rosa desfolhada"



"Tento compor o nosso amor
Dentro da tua ausência
Toda a loucura, todo o martírio
De uma paixão imensa
Teu toca-discos, nosso retrato
Um tempo descuidado
Tudo pisado, tudo partido
Tudo no chão jogado

E em cada canto
Teu desencanto
Tua melancolia
Teu triste vulto desesperado
Ante o que eu te dizia
E logo o espanto e logo o insulto
O amor dilacerado
E logo o pranto ante a agonia
Do fato consumado

Silenciosa
Ficou a rosa
No chão despetalada
Que eu com meus dedos tentei a medo
Reconstruir do nada:
O teu perfume, teus doces pêlos
A tua pele amada
Tudo desfeito, tudo perdido
A rosa desfolhada"

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Movimento



O tempo escorre como água.
A vida passa como vento.
Rajadas de ar,
Às vezes frias, às vezes quentes.
Relâmpagos de dor,
O sofrimento desacelera.

A areia da ampulheta não termina,
Girá-la não adianta.
Nada nunca irá parar,
O movimento é a condição.

Pulso infinito,
Corrente constante,
Tremor trepidante,
O universo é ato.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Utilidade



Com nós no peito,
Sigo assim.
Pensar no que fazer,
Algo útil...

Como seguir algum caminho,
Se o caminho é não o tê-lo.
Ser livre como um pássaro no céu,
Em vez de um carro numa estrada.

A mente mecânica ilude...
Os sentidos estão aí
Para mostrar a verdade.

O pensamento pensa demais.
O sentimento também.
As sensações são reprimidas,
O que acompanha a dor das mesmas.

Preciso ser alguém,
O mundo pede isso.
E, apesar de me entender vazio,
Meu redor não o permite.

Preciso aprender a ser só,
A só ser...
Pois quando ela vier me buscar,
Sozinho vou estar.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Dor

Na noite fria
O vento fuma meu cigarro,
As cinzas caem sobre meus pés
E a brasa alcança meu dedo.
O calor queima,
Estou vivo.


quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Sol



Olhando o azul escondido pelas nuvens,
Vejo um pássaro, voo com ele.
Pelos seus olhos aparece a fresta
Nessa imensidão branca.
Plano sobre o verde refletido da mata.
Não sei se olho acima ou abaixo...
Atravesso então o céu,
Almejando o firmamento,
A abóbada celeste.

O branco, agora intensificado,
Está amarelado pelos raios do sol.
Essa luz divina
Que alimenta tudo e a mim.
A razão do verde,
A raiz de todas as contemplações.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Números


Entendo que o um é a origem,
E o dois a dualidade.
Vejo no três o primeiro equilíbrio,
E no quatro sua planificação.
O cinco abre a porta do infinito,
E o seis é sua malha.

O sete é o metafísico,
E o oito os possíveis caminhos.
O nove não se enxerga,
E, chegando ao dez, a gente volta
No ciclo infinito que parte do nenhum.

sábado, 29 de novembro de 2008



"Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos me encaminham pra você

Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer

Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
E eu não existo sem você"

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Vida e morte



O verde, à noite, escurece...
O vermelho arde,
E o amarelo desaparece.

O preto, então, aparece
Na noite onde as cores somem.
Me resta o branco, interno.

É nessa imensidão vazia
Que meus sentimentos florescem,
Quietos...

Minha alma, fervida pelo dia,
No preto se revela...

Os potenciais de dentro
Se misturam...
Alguns vivos,
Outros a caminho da morte,
Nessa infinitude que existe
E deixa de existir a cada segundo.

Vitalidade extensa,
Mortricidade intensa,
Embaralha-me, intensifica-me,
A cada morrer e a cada viver...

Sou um motor de solidões frias,
Conexões quentes
E relações vazias.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Contato

Olhar que transcende a imagem
Como a metáfora que transcende a linguagem.
Magnetiza-me,
Encanta-me,
Faz-me presa,
Necessitando entregar-me.

Meu corpo, então,
Se traduz em vontade
De querer completar-me com sua realidade
E transformá-la, junto à minha,
Numa satisfatória verdade.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Ser ou trabalhar



Minha vida é contemplar.
Reconheço o céu e suas nuvens.
As plantas e suas flores.
O universo e suas galáxias.
Do micro ao macro,
Deixei minha mente devanear.


A partir disso,
Vem a necessidade de exprimir.
Mas sempre me preocupei tanto em enxergar,
Que o fazer foi esquecido.

Não consigo ser poeta,
Nem artista, o que sempre quis.
Falta dedicação a mim.
Todo esse tempo somente a apreciar,
Limitou meu expressar.
Agora só consigo lamentar.

Voltar atrás? Impossível.
E nem sei se quero,
Porque tudo que sou hoje,
Devo ao que contemplei.

Apenas sofro,
Quando choro ao ver, num dia chuvoso,
Um rachar amarelo entre as nuvens,
Me mostrando a imensidão azul...
E depois não saber o que fazer com esse chorar.
Escrever torto é o máximo que consigo.

O mundo quer que eu trabalhe, estude...
Fico perdido.
Pois tudo o que leio
Parece um buscar do reflexo da lua
Em uma água turva.
Sem saber que basta olhar acima.

Só o misticismo me interessa,
Mas não há faculdade para isso.
Preciso de dinheiro, fazer o quê.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Vôo



Leva sua vida
Porque, no caminho, há de surgir poesia.
Mova-se por suas amizades,
Pois são elas que estarão sempre ao seu lado.

Ame todos, deixe falar quem quiser.
Diga sim para não dizer talvez.

À noite, busque as estrelas,
Mesmo que as luzes da cidade as escondam.
De dia, procure o verde,
Mesmo que os prédios o oculte.

Olhe o céu e ache os pássaros,
Mesmo que inexistentes.
Eles são o maior ensinamento.
Eles e as flores,
Que se abrem mesmo à noite.

Abaixa estes ombros,
Cuida do seu corpo.
A vida é longa, companheiro...
O tempo não parará,
Por mais que você queira.

Apague as luzes,
Respeite a noite,
O escuro, a morte.

O caminho está no ar,
Basta aprender a voar.